segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Histórias dos Mestres apresenta: Juracy Simões da Tribo Canindé do Recife



 Juracy Simões da Silva, conhecida como Juracy de Canindé, exerce o cargo de presidenta da Tribo Canindé do Recife. Cursou o antigo curso pedagógico e também fez contabilidade, passou no vestibular em uma universidade privada, mas nos conta que seus pais não puderam fazer esse investimento em seus estudos:
Éramos pobres, pobres, pobres. Trabalhei nos Correios por 10 anos mais chegou o momento de escolher entre trabalho ou cuidar do meu pai e preferi cuidar dele. E hoje é que não trabalho mesmo, porque o Canindé toma todo meu tempo.

  Foliã nata, ela conta que foi “gerada, nascida e criada dentro do Canindé”. Seu pai, Severino Batista da Silvam era o presidente da agremiação. Quando ele faleceu, em 1994, Juracy foi a primeira mulher a ocupar esse cargo em uma agremiação dessa categoria.

  A tribo Canindé foi fundada em 1896 e era composta apenas por homens. No entanto, segundo Juracy, na gestão de seu pai já havia mulheres na diretoria e ela, mesmo sem ter conhecimento do assunto, foi sendo preparada para o cargo que ocupa.
Juracy deu novo impulso às atividades do grupo e maior visibilidade à agremiação. Organizou-a jurídicamente e estabilizou a situação financeira. “Eu me aperrei muito, chorei muito, mas resolvi me regularizar”, diz. Além disso, criou um acervo histórico, renovou o figurino e conquistou por nove vezes consecutivas o campeonato no concurso do carnaval do Recife. Em 2009, Canindé foi reconhecida como patrimônio vivo de Pernambuco. Ela assim descreve sua atuação à frente da agremiação:

Hoje eu faço tudo, terminou o carnaval eu já faço uma sinopse e já fico matutando o que vamos fazer pro próximo carnaval. Até nas cores eu penso, só que eu começo a articular isso comigo mesma e só passo à frente quando tenho certeza. Também sou muito determinada, aí só depois que decido, chamo minha equipe pra trabalhar, eu tenho uma equipe onde existem mais mulheres que homens. Sou muito exigente... agora estou até mais maleável porque o jovem predomina muito e como o Canindé é todo jovem, sou muito paciente com eles, é difícil eu ficar impaciente. Já sabem como distribuir, eu não tenho que ficar encarnando, acho que todo mundo sabe seu papel e como não gosto de palpitem evito ficar dando.

  O aspecto religioso é fundamental na Tribo Canindé. A agremiação é vinculada ao Candomblé e a tradição é mantida hereditariamente por Juracy, segundo explica:

A religiosidade em Canindé qualquer um percebe, é muito evidente. Tem a religiosidade dos mestres, que foi de meu passado e eu tenho respeito e muita admiração. Tem o mestre de vovó, tem o mestre do meu padrinho que era juremeiro e também era do Candomblé. Tem a cabocla dele, tem a Oxum da Casa, tem o Xangô da Casa que eu tenho uma empolgação muito grande... Então, tem Deus que o Todo-Poderoso, ele que rege tudo, e as entidades espirituais, que tem uma ligação muito forte.

  Após ter superado vários problemas, hoje revigorada, Juracy reconhece que são muitos os limites que enfrenta, inclusive do ponto de vista amoroso. “Depois que me tornei presidenta, não me liguei mais a ninguém, não quis saber de nenhum relacionamento duradouro... Eu fui muito mal-amada. Quem me ama hoje é Deus, Canindé e os Orixás”. Mas não desanima: “Tudo o que eu faço é gostoso, Canindé, as roupas, os ensaios, essas coisas todas preencheram a minha vida”.



Fonte: SILVA, Claudilene. SOUZA, Ester Monteiro da. Sem elas não haveria carnaval: mulheres do carnaval do Recife. Recife: Fundação de Cultura da Cidade do Recife, 2011. p 72 

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